A META: alcançar, um pouco de cada vez, a integração da personalidade. Da roupa que uso ao trabalho que exerço, do alimento do corpo ao alimento do espírito: desejo alcançar uma unidade tal na vida que irradie bem-estar a mim mesmo e a quem conviver comigo.
Integração da personalidade. Ela ultrapassa o mero “saber o que quer”: fulano “sabe o que quer”. Não, não se trata disso, somente. É um centro existencial, uma segurança interior. É olhar o próprio rosto no espelho, no fundo dos olhos, e perceber no semblante, na voz, nos gestos, no porte, no expressar e em tudo o mais, por menor que seja, que tudo é gerado por um dínamo na alma chamado “eu”.
Saber distinguir cada importância, cada peso, cada proporção e lugar correspondente das coisas na vida. Ter consciência de quem já fui, clareza de quem sou e projetar quem pretendo ser. Posso ser influenciado — é inevitável. Posso me enganar — estou sujeito. Contudo, que eu possa voltar atrás caso o pé se desvie do melhor por alguma razão; que eu possa convergir novamente a meu núcleo puro e indivisível.
As condições do projeto são as mais desfavoráveis. Nosso país está programado para fragmentar a personalidade. É uma sociedade da microloucura não-diagnosticada. A infelicidade, por estas bandas, é quase uma lei da Física (quase). É uma sociedade na qual a malícia passa por bom-humor, a suspicácia passa por vigilância, o cinismo passa por inteligência. É a sociedade do quase, do semi-, do parece-mas-não-é, que esteriliza o viver e sufoca os sonhos. É a sociedade em que boa vontade é confundida com vaidade.
Aqui, é comum não se dar conta da adequada relação entre idade cronológica x idade mental x idade cultural. Aqui, é comum desconhecer a realidade imediata em que se vive, e porquê se vive daquela maneira e não de outra. Aqui, entope-se a cabeça com um turbilhão de informações que pouco ou nada nos diz respeito e despreza-se o conhecimento que é bom, útil e proveitoso. Aqui, nutre-se desejos equivocados por pura osmose, inverte-se prioridades confusamente, combate-se o inimigo errado, despreza-se a quem se devia valorizar e vice-versa, etc. etc.
A herança familiar nos marca, desde um passado remoto. O longínquo passado de todo brasileiro é marcado pela injustiça, pela brutalidade, pelo barbarismo, pelo erro. O triste destino de nossos antepassados nos atrai, com força, feito um buraco negro, a fim de terminarmos naqueles mesmos infortúnios (não por culpa deles, evidentemente; é algo espiritual). Todavia, não se trata de uma situação inexorável, um destino fatal. Vencer é possível.
A integração da personalidade abrange, além de nós mesmos, nossa família e nossos semelhantes. Lutar por ela vale a pena, dia após dia. Estar consciente é metade do caminho. Aos poucos, as coisas desarranjadas da vida podem se ajustar, calmamente, sem quimeras: decisões são tomadas com mais clareza, a força interior brota, a coragem retorna e a inteligência revigora.
A integração da personalidade conquista-se lentamente, sem artificialismos nem truques. Haverá percalços de toda sorte para atrapalhar, certamente. Pois que haja em nós o mais importante: fé em Deus: o combustível que move toda a engrenagem da vida.
*Ilustração: William-Adolphe Bouguereau – Monsieur M. (1850)