O homem
de gênio
e o talentoso

INÚMERAS injustiças afligem o mundo. Ponho minha lupa numa delas: há pessoas geniais vivendo abaixo do que merecem e talentos medianos vivendo acima do que merecem.

É incrível. Há pessoas dotadas de enorme potencial, inteligentes, sábias e capazes, mas seus resultados – aquilo que efetivamente obtém com sua alta capacidade – são parcos, modestos, diante de suas enormes possibilidades. Não existam pessoas totalmente desprovidas de talento. Todos tem algum dom, obviamente. Um desperdício.

E o outro tipo de pessoa? É aquele com algum talento, não brilhante. Gente razoável, regular, dão conta do recado e só. Poderia-se chamá-las medíocres, embora o termo já esteja um tanto saturado e seja usado para rebaixar, o que não é o caso aqui.

Entre os muito e pouco capazes ocorre uma situação curiosa. Normalmente, o muito talentoso não é compreendido pela maioria. É visto como excêntrico, diferente, estranho. Até reconhecem que há “algo ali” que não conseguem explicar ou entender profundamente e, por isso, tendem a isolá-lo. Esperam sua adesão a eles, sua “normalização”. No fundo, parecem temê-lo ou invejá-lo inconfessadamente e por precaução, não lhe abrem espaço: evita-se, assim, que o espaço concedido seja inteiramente tomado por ele e não sobre nada para mais ninguém “normal”.

O pouco talentoso não surpreende, não inova, não fede e não cheira. Considera um insulto ser superior. Ele se basta. Todavia, ele possui uma vantagem ao excelente: seu magnetismo pessoal. Ele atrai os semelhantes. É fácil constatar: observe os artistas e músicos da moda, os opinadores profissionais do momento, os líderes diversos: dão-lhes crédito, porque ouvi-los nunca é um perigo.

Mas evito generalizações. De fato, há pessoas altamente dotadas e igualmente admiradas. Se hoje Dom Quixote da Mancha é considerada uma obra brilhante e admirável, Cervantes também foi um escritor brilhante e admirável, sem dúvida: só não sei se ele foi considerado assim em seus dias. Temo que não.

O talentoso é combatido por muitos. É odiado pelo inimigo e desprezado pelo medíocre; é amado ou desperta paixões em alguns, arrebatando-os. É amor ou ódio, sem meio-termo. E quanto ao apenas razoável? Suas contradições, erros e idiossincrasias passam despercebidas ou são poupadas da crítica, como se os amigos, solidariamente, evitassem entristecê-lo apontando suas falhas. É querido ou ignorado sempre comedidamente.

Quanto ao número, os pouco talentosos são maioria. Obtém favores e até alcançam realizações, em muito facilitadas por outras pessoas que lhe servem gentilmente e sempre acima do que seu mérito pessoal reclama.

Do outro lado da balança está a minoria, os excelentes. Obtém alguns resultados também, mas abaixo do que lhes caberia e seria justo. Embora tenham o algo a mais, a chama misteriosa, as massas somente lhe notam tempos depois, talvez séculos. Afinal, eles sempre estão anos à frente de seu próprio tempo.

É uma situação curiosa. A sociedade humana parece empurrar os medíocres para a frente, dando-lhes espaço, atenção e privilégio e nos seus dias, eles se dão muito bem. Em contrapartida, o eterno e o perene está reservado somente aos gênios, aos excelentes. É deles o amanhã e as obras que as gerações vindouras considerarão de alto valor. Serão reverenciados e conhecer-lhes o nome será obrigação. Quanto aos medíocres, seus nomes serão simplesmente apagados e esquecidos.

Talvez esta seja uma lei do universo. Nunca saberemos.

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